Técnica vocal

Fique por dentro de dicas valiosas para você aprimorar seu canto!

1. Conceito geral sobre fonação

Falar (fonar) não é um ato natural. Ao longo dos anos, o homem desenvolveu algumas adaptações para garantir a sua sobrevivência e falar foi uma delas. As pregas vocais, inicialmente, tem a função de repelir os corpos estranhos que vão na direção dos pulmões. A fala, usando as mesmas para a produção de sons controlados, é o resultado de uma adaptação evolutiva.

Partindo desse princípio, é bem fácil entender por que é tão danoso cantar sem os devidos cuidados. Estamos falando de um conjunto delicado de ligamentos, adaptados a fonação, mas que não têm essa função natural. Quaisquer esforços aplicados desordenadamente podem ser desastrosos, até por que o menor dos pólipos pode causar distorções (rouquidão) ou mesmo bloquear o fechamento correto das pregas. Constatação: mais de 70% dos professores de ensino regular (indiferente de serem ou não cantores) possuem ou já tiveram um histórico de rouquidão por pólipos ou nódulos.

Cantar é um ato anti-fisiológico em alguns momentos (será fácil de entender posteriormente) e por isso deve ser minuciosamente estudado, para que não hajam danos a sua saúde geral, bem como a vocal.

'Falar é um ato humano de esforço controlado. Cantar é um ato controlado de esforço sobre-humano'.

2 – Respiração

Muitos problemas no canto estão relacionados à respiração. Veja que ainda não estamos falando de apoio, mas da simples forma como você respira. Faça um pequeno teste: Inpire profundamente e olhe-se no espelho. Qual a parte do seu corpo que expande nesse momento? A maioria esmagadora verá o peito expandindo, como uma resposta lógica do cérebro para o comando "respirar", já que, além do cérebro 'acreditar' que a capacidade aérea ser maior nessa região (mas de fato não é!!!), o homem adulto acumula muitos temores que influenciam na sua respiração, além de questões sociais e até mesmo estéticas que determinam essa condição.

Cantar, porém, exige controle do ar empregado sobre a voz e respirar dessa maneira (elevando o peito) não permite que você tenha esse controle de maneira refinada.

Agora pegue um pedacinho de papel, aplique sobre ele uma borrifada muito leve do seu perfume preferido e tente identificar qualquer fragrância amadeirada nele. Inale profundamente, permitindo que o fluxo de ar leve o aroma até suas terminações olfativas mais sensíveis. Nesse momento, perceba que como o comando ao seu cérebro não foi "Respire!" o ar não vai para a região torácica. Isso acontece pois existe a necessidade de controlar o fluxo de ar a fim de carregar as partículas para sua região olfativa. Seu comando determina que é maior a necessidade de controle do fluxo do que a de "estoque" de ar e seu cérebro obedece imediatamente.

Comece a perceber o quanto cantar exige, acima de tudo, uma reeducação global do seu corpo e que orientação é fundamental para que tudo seja corretamente executado.

3 – Apoio



Como falei antes, cantar às vezes vai na contra-mão da fisiologia natural, em alguns momentos. O controle que empregamos, muitas vezes, vai contra o que o nosso corpo quer e está acostumado a fazer espontaneamente. O apoio é uma das questões mais complexas e interessantes do Canto. Na minha opinião, 100% dos músicos práticos não sabem ou tem uma noção totalmente deturpada do que é Apoio. Recebi gente nas aulas que já cantava há anos na noite – e que chegou aqui só com o "preciso refinar a técnica que já tenho"- e quando perguntado sobre "O que você entende por Apoio?" alguns respondiam que era quando o ar devia ir para o diafragma, outras que o ar iria para o abdômen... já cheguei a ouvir que era quando o ar ocupava o espaço do intestino...

Ponto 1 - Lugar de ar é nos pulmões!!

Enfim, como comentei na parte sobre Respiração, nós cantores precisamos de controle do ar que empregamos na voz. Mesmo que inspiremos da maneira correta, apoiando os pulmões sobre o diafragma, qual é a tendência natural de resposta do músculo diafragmático? Evidentemente é de expelir o ar, já que a troca gasosa (que é a função a qual o seu corpo está programado a fazer) já foi realizada. O ar também é pouco denso e a tendência natural é a saída espontânea pelas vias respiratórias, além da elasticidade do tecido pulmonar, que faz com que haja uma expulsão do ar. Uma das principais funções do apoio é, portanto, o aprisionamento desse ar para que ele seja utilizado de forma controlada no canto, criando uma uniformidade na corrente de ar expelida, minimizando o esforço e tornando toda a emissão vocal uniforme. Esse aprisionamento DEVE OBRIGATORIAMENTE estar ligado a respiração, caso contrário a musculatura de retenção e controle irá dificultar ainda mais o Canto. Difícil de entender? Seu professor explicará com muita facilidade, na prática.

Mas é importante entender que o simples fato de prender o ar não significa exatamente "apoiar". Isso deve representar cerca de 15% do mecanismo de apoio e a questão é muito mais complexa, devendo ser treinada a exaustão com um orientador que saiba exatamente como lhe explicar o processo inteiro.

4 – Emissão Vocal

Outro problema bastante comum em 99% dos cantores práticos. A maioria apresenta constrições na região do pescoço e da laringe, apresentando uma emissão vocal inadequada, forçada em regiões médio agudas e com tensão medial acima do normal, provavelmente por não saber usar o apoio e compensar a desafinação com esforço vocal. Alguns ainda apresentam uma presença de ar na voz, maquiando o timbre e fazendo com que o fechamento das pregas vocais seja imperfeito, podendo culminar numa fenda, que é uma patologia da voz de difícil tratamento. A emissão vocal de qualidade depende basicamente do bom trabalho sobre os fatores anteriores, uma vez que se a coluna de ar empregada estiver inconsistente, a voz tb apresentará uma inconsistência, forçando o cantor a compensar DE MANEIRA ERRADA com tensões desnecessárias.

Uma emissão vocal de qualidade apresenta uma vibração natural das pregas vocais, um aproveitamento de ar eficaz para a produção do som, bem como um timbre definido e consistente. Cantores que forçam uma mudança de timbre para emular outros cantores (imitar) tendem a ter problemas graves de emissão vocal, sendo de difícil trabalho para desvincular a "imitação" do canto, posteriormente.

5 – Ressonância


Voz de peito e voz de cabeça tem esses nomes por motivos, primariamente, didáticos, para ajudar na compreensão das regiões ressonantes. Isso não significa que voz de peito ressoe no peito!!! É apenas um termo didático para designar a voz emitida com ressonância mais baixa, normalmente mais grave. "Normalmente" está grifado, pois é normal no canto popular, encontrar cantores que levam a voz de peito até regiões agudas, bem como algumas que, por critérios interpretativos, usam de uma voz grave com uma cobertura característica da voz de cabeça. Não vamos entrar no mérito técnico, mas a principal característica da voz de cabeça é a Cobertura. A grosso modo, a cobertura posiciona a ressonância de forma a amplificar o som produzido, além de agregar harmônicos importantes na formação do som emitido. Novamente, não adianta tentar descobrir isso sozinho. Sob a orientação de um professor, algumas pessoas demoram muito tempo até compreenderem bem o processo de cobertura – e algumas simplesmente não compreendem, mas acabam fazendo, por serem corretamente orientadas.

6 – Impostação


O termo Impostação é advindo do canto lírico e tem no seu significado imposição. A utilização tem como objetivo a aglutinação de alguns formates da voz do cantor para que haja um ganho de amplitude, na faixa dos 3000hz, que é ponto mais sensível do ouvido humano, tornando a voz, portanto, mais penetrante, sem a necessidade de aplicar tanta intensidade (intensidade = volume não tem que ser uma preocupação do cantor). É um fundamento do canto, que torna a voz consistente e minimiza os esforços, uma vez que há uma menor necessidade de força, bem como ajusta o trato vocal para potencializar os ressonantes. Uma das características da impostação é o rebaixamento de laringe e elevação do véo palatino, além de outras condições mais complexas.

No canto popular a impostação é menos acentuada, mas não menos importante. Porém, ao longo dos anos, o termo sofreu uma deturpação e "impostação" no popular, passou a representar uma "mudança de voz", associando o termo à palavra "impostor". Esse tipo de "impostação" (palavra que nem deveria ser usada) é errado, pois gera tensões, normalmente de língua e laringe, que são altamente prejudiciais à fonação.

7 – Vibrato



O vibrato no canto lírico é o termômetro que uma voz está bem colocada e sadia. Segundo a escola italiana (a mais completa em termos de estudo, ao meu ver), o vibrato não é exatamente uma "técnica" e sim o resultado de uma técnica vocal equilibrada. Ele é gerado pelo efeito de Bernouille, que é similar ao que acontece quando um carro passa em alta velocidade e as folhas ao chão se movimentam no vácuo gerado pelo deslocamento de ar. No canto lírico, o vibrato é presente quase que o tempo todo, diferentemente do canto popular, onde é usado como ornamento apenas.

No canto popular, o resultado pode até ser parecido, mas a causa e efeito são perceptivelmente diferentes. O termo vibrato já é comumente usado, mas creio que trêmulo seria uma definição mais correta. Nesse caso, alguns paliativos, como alteração da coluna de ar por mudança da pressão diafragmática ou alteração tonal proposital surtem um efeito parecido (porém não igual). Mas é importante, excepcionalmente nesse caso, ter uma orientação adequada, pois esses substitutivos requerem uma preparação vocal adequada, como o posicionamento de laringe baixa para que não hajam esforços excessivos.

8 – Falsete

Já lemos (todos) e até ouvimos de alguns professores que o falsete é a voz produzida nas "falsas pregas vocais", com abertura das "pregas verdadeiras em paralelo" e que "mulheres não têm falsete". Façamos uma mea culpa já que a culpa, na verdade, é generalizada, como veremos a seguir. Vamos separar as coisas e elucidar tecnicamente o que é falsete.

Falseto é um termo que vem do canto lírico, usado para indicar a "falsa voz" com intuito de emular a voz feminina. Por isso, alguns professores dizem que mulheres não têm falsete, já que na prática, o termo não se aplicaria à elas. Mas anatomicamente, somos todos iguais, portanto, mulheres têm sim capacidade de executar "falsetes".

Sobre a origem do som: Nada de falsas pregas vocais. Mas a culpa dessa informação não pode ser atribuída especificamente a ninguém. Na escola alemã de canto lírico, no século 19, houve uma descrição de falsete nas "falsas pregas vocais", porém sem nenhum embasamento científico (creio que hoje em dia as informações já estejam mais atualizadas nesse sentido). A escola moderna italiana veio, mais tarde, descrever o falsete com exatidão, dizendo que o som é produzido pelas pregas vocais verdadeiras, com fenda em paralelo, usando um fenômeno de pitch nos harmônicos da voz (não necessariamente no fundamental), como se fosse um assovio ou um harmônico de instrumentos de cordas. Nas mulheres, o resultado da utilização dos falsetes não é um som lá tão agradável (tudo bem, há controvérsias, já que gosto é gosto), mas as mulheres possuem um outro registro em que a utilização seria equivalente: O Whistle ou flageolet. Mas vale o esclarecimento: Utilização equivalenteno sentido de atingir mais agudos, mas a execução é totalmente diferente, portanto não é a mesma coisa. Não tenho certeza, honestamente, pois não sou nenhum conhecedor (por desinteresse mesmo) sobre o assunto, mas me parece que a execução disso se dá com uma conformação triangular das pregas vocais. Se eu tiver mais detalhes, atualizo aqui.

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